Qual o sentido da vida?
A aula inaugural do segundo semestre de 2014 provocou na comunidade IEIJ uma reflexão profunda sobre o sentido da vida.
Você é feliz?
O que é a felicidade?
O que falta para voce ser feliz?
Vamos Refletir juntos?
Compartilhamos a seguir, a palestra proferida pela nossa convidada Eleanor Teruya.
"O Sentido da Vida
Bom dia!
Estamos aqui hoje, dia 14 de julho, segunda-feira, 7h30 da manhã, prontos para iniciar uma semana de estudos, de trabalho, prontos para iniciar o semestre letivo.
Gostaria de convidá-los para iniciar esse tempo refletindo sobre a vida, ou melhor, sobre o sentido da vida. De vez em quando, é aconselhável pararmos um momento para pensarmos: “Afinal, por que ou para que estou fazendo o que faço?”; “Por que venho para escola? Só porque sou obrigado?”; “Por que estou trabalhando? Só para ganhar dinheiro?”; “O que eu quero fazer da minha vida? O que eu quero ser? O que eu quero ter? E, por que eu quero isso?” Se não pararmos para pensar, corremos o risco de vivermos como robôs.
Recentemente, vocês tiveram a perda de uma pessoa muito querida aqui da escola. Não tive muito contato com ela, mas, pelos comentários que ouvi, sei que foi uma pessoa muito especial, e que deixou saudades. E, geralmente, nesses momentos de perdas é que pensamos sobre o valor, sobre o sentido da vida. Quando as coisas vão bem, quando as coisas dão certo, em momentos de festas e de comemorações, não ficamos refletindo, pensando, questionando. Então vamos aproveitar esse momento para crescer, para amadurecer um pouco mais.
Peço licença para utilizar algumas referências de um livro que está na Bíblia com o nome de Eclesiastes. Esse livro na língua original, o hebraico, chama-se Coelét e esse nome significa orador, pregador, alguém que discursa em uma reunião de pessoas. É um livro de cunho filosófico. O autor está questionando justamente o sentido da vida. O gênero literário do livro é sapiencial, de sapiência. Vem do latim sapientia, e significa extremamente sábio, com uma sabedoria divina e humana. Sendo Coelét um sábio, é bom a gente prestar atenção em suas palavras. O livro foi escrito mais ou menos em 400 a.C., 2600 anos atrás.
Naquela época o sábio era um especialista na arte do discernimento, um organizador da cultura e da história do povo. Alguém que coletava, reunia as histórias, os contos, até mesmo as lendas e precisava discernir e enxergar o que era bom, virtuoso, bonito e válido. Precisava organizar e transmitir tudo isso. Por vezes, a experiência de séculos de história somada à reflexão pessoal.
Talvez o estereótipo (modelo) que fazemos de um sábio é de uma pessoa de idade, retraída, afastada das preocupações diárias, conhecedor de muita coisa, mas sem sentido prático: sabe muita coisa que não serve pra nada ou alguém com a cabeça no mundo da lua, distraído. Mas, diferente dessa imagem, primeiro, não existe idade para se ter e buscar sabedoria. Pode ser alguém jovem, adulto, idoso. E, diferente da pessoa avoada, o sábio é alguém profundamente preocupado e atento aos acontecimentos que o rodeiam. É uma pessoa equilibrada e de bom senso. Talvez, hoje em dia, não encontremos muita gente assim, porque, para isso, é necessário tempo para observar, refletir, meditar e contemplar. Tempo para processar as informações que recebemos. E parece-me que tempo é o que menos temos nos dias de hoje.
Normalmente, a sabedoria é associada ao conhecimento, às pessoas inteligentes ou àquelas que sabem muita coisa. Mas, sabedoria é diferente de conhecimento. Podemos ter muito conhecimento e não saber usar corretamente, saber muito e não termos sabedoria para usar esse conhecimento. Por exemplo, a internet – local onde há muito conhecimento, mas precisamos de sabedoria na hora de utilizar esse conhecimento.
Viver com sabedoria não consiste apenas em viver por viver. Não é viver somente com a finalidade de estudar, trabalhar, constituir uma família, realizar-se profissionalmente e morrer. Viver com sabedoria consiste em encontrar um sentido em tudo que se faz.
Quando pensamos no sentido da vida: o que eu quero da vida ou qual é meu grande sonho, uma das primeiras coisas que nos vêm à mente é: Ser feliz! A busca da felicidade é o sonho de todos. Será que alguém aqui tem o sonho de ser infeliz? Mas o que é ser feliz? Como alcançamos nossa felicidade?
Geralmente, as respostas estão relacionadas ao dinheiro (caso tenha muito dinheiro), ao conhecimento, à realização (ser excelente médico, físico...) à fama, ao casamento ou a ter uma família.
Nesse livro, Coelét fala que teve de tudo: dinheiro, bens materiais, fama, sucesso nos empreendimentos, tesouros, diversões, procurou todos os prazeres imagináveis: “não me neguei nada que os meus olhos desejaram; não me recusei a dar prazer algum ao meu coração”.
Pense em tudo aquilo que você está se esforçando para ter, para conseguir. Pode ser as pequenas coisas: celular de última geração, uma roupa, games, viagens, um amigo, uma faculdade, muito dinheiro, uma mansão... Pense em todas as coisas que gostaria de ter feito e não fez, tudo que gostaria de ter e nunca teve. Coelét teve tudo e muito mais. Ele teve tudo e fez tudo, e, no fim, qual sua conclusão? Que tudo se mostrou inútil, que tudo isso é ilusão, é como correr atrás do vento. Em algumas traduções diz que tudo é vaidade. Essa palavra no original hebraico tem um sentido um pouco diferente que utilizamos hoje. Hoje, a vaidade é mais sinônimo de orgulho, vaidosa é a pessoa que gosta de ser elogiada. Mas, aqui, quando Coelét diz que tudo é vaidade tem o significado de alguma coisa passageira, transitória, como uma fumaça ou como uma bolha de sabão. Quanto tempo dura? Segundos? Não é possível reter com as mãos.
Mas, e aí? Se a felicidade não está no trabalho, na diversão, não está em comer uma pizza com os amigos, em ir ao shopping, em constituir uma família, onde está?
Coelét dá uma dica: chegou à conclusão que o importante é aprender a desfrutar a vida. Coelét diz que se alegrava em todo trabalho que fazia e, isso, foi a recompensa do seu esforço.
Nosso problema está em querermos usar as coisas e as pessoas, esperando que elas nos tragam a felicidade. Vivemos com a sensação de que as coisas, pessoas e eventos são uma espécie de trampolim para a felicidade. Pensamos que se tivermos aquele celular, aquela pessoa, aquele emprego, vamos ser felizes. A gente faz alguma coisa e espera que uma gratificação venha depois e, normalmente, ela não vem. Porque a felicidade, aquilo que deve ser desfrutado, é no momento em que as coisas estão acontecendo. A felicidade deve ser desfrutada no momento em que estamos comendo uma pizza ou enquanto estamos com os amigos.
Uma revista britânica publicou o trabalho de um grupo de psicólogos que analisou as palavras de 200 pensadores ? Napoleão, Gandhi, Bob Dylan, Einsten, Thomas Jefferson, Freud, etc. ? sobre qual seria o sentido da vida. A conclusão foi a de que “é preciso desfrutar a vida enquanto for possível”. Eles chegaram a mesma conclusão que Coelét chegou há 2600 anos atrás.
Uma lição que podemos aprender é: desfrutar a vida. Saboreá-la. Vivê-la intensamente, a cada momento.
Coelét diz também que a vida é feita de movimentos e, com isso, precisamos de equilíbrio. Pois na vida, há um tempo para todas as coisas.
Tudo neste mundo tem o seu tempo; cada coisa tem a sua ocasião.
Há tempo de nascer e tempo de morrer;
tempo de plantar e tempo de arrancar;
tempo de matar e tempo de curar;
tempo de derrubar e tempo de construir.
Há tempo de ficar triste e tempo de se alegrar;
tempo de chorar e tempo de dançar;
tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las;
tempo de abraçar e tempo de afastar-se de abraçar.
Há tempo de procurar e tempo de perder (desistir);
tempo de economizar e tempo de desperdiçar; (tempo de guardar e tempo de jogar fora)
tempo de rasgar e tempo de remendar;
tempo de ficar calado e tempo de falar.
Há tempo de amar e tempo de aborrecer;
tempo de guerra e tempo de paz.
Para que a vida tenha sentido, ela precisa ser vivida, nesse movimento, no meio dessa tensão entre coisas contraditórias, opostas. Viver com sabedoria não significa viver só para os momentos felizes. Os momentos tristes, a dor, a saudade e as frustrações também fazem parte da vida. E tudo isso também precisa ser vivido, experimentado. Não devem ser camuflados ou escondidos. O momento que considero importante para ser bem vivenciado é o do luto. Penso que precisamos sentir a tristeza e chorar, ter saudades e lembrar, e não querer fugir desses momentos. Isso não é masoquismo. É aprender a trabalhar esses sentimentos.
Coelét é um livro de sabedoria. Quem escreve é um sábio, alguém que já viveu, experimentou e tem autoridade para dizer que há tempo para todas as coisas nesse mundo, as coisas boas e as coisas não tão boas. A princípio não gostamos de ouvir e podemos perguntar: quem é que gosta de chorar ou de separar? Mas, se pensarmos bem, quem é que suportaria passar o resto da vida sempre abraçado, por mais que gostemos da pessoa? É bom rir, mas será que tem graça ficarmos rindo o tempo todo?
O sofrimento traz crescimento e amadurecimento. Ficamos mais fortes e sábios quando conseguimos superá-lo.
Hoje vemos uma rejeição quase absoluta ao sofrimento. A sociedade moderna não aceita o sofrimento. A indústria de medicamentos produz toneladas de antidepressivos que são receitados ao primeiro sinal de tristeza. Não se pode ficar triste. Nós temos sempre que estar bem, ou, pelo menos, aparentar que estamos.
Para aumentar a venda dos medicamentos, também somos convencidos de que não podemos suportar a mínima dor. Para qualquer dorzinha que sentimos há um remédio. Até mesmo para dor de cotovelo. É lógico que precisamos usar o bom senso. Não vamos passar por sofrimentos atrozes se podemos lançar mão de medicamentos que aliviem a dor, mas, também, não precisamos ficar dependentes e tomar remédios para qualquer coisa, por um mínimo mal-estar. A dor é um mecanismo de defesa do organismo. Ela também serve para nos lembrar de como é bom termos saúde. Mas só lembramos quando estamos sentindo algo. Somente quando tenho, por exemplo, uma dor de cabeça é que me lembro de como é bom não ter.
A indústria de entretenimento é outra que cresce porque as pessoas querem manter-se ocupadas e felizes. O que a mídia, a televisão e as revistas passam é que você é obrigado a ser feliz e, para tal, apresentam cada vez mais novidades. Você tem que se adequar ao modelo produzido pela ditadura da moda. E ficamos tão ocupados correndo de um lado para o outro e não percebemos que tudo isso produz uma alienação da realidade e traz uma ilusão da felicidade. Acabamos crendo e perseguindo uma fantasia que não tem fim, pois é uma ilusão. Esquecemos do movimento de Coelét, porque queremos forçar a ficar só de um lado e a vida não é assim.
Devido às características do mundo atual, nossa tendência é não querer pensar ou falar sobre sofrimento. Muito menos passar por ele. Mas precisamos lembrar que a vida é dinâmica, que está em contínuo movimento. Temos emoções e sentimentos que precisam ser vivenciados.
Outro ponto consiste em aprender a olhar a vida como uma dádiva, como um presente, e sermos gratos, agradecidos pelo privilégio que temos em simplesmente estarmos vivos. Se pararmos um minuto para pensar, veremos que temos muito mais motivos para agradecer do que para lamentar. Basta olharmos ao nosso redor. Ver a natureza, o sol, as flores e as árvores. Olhe do seu lado e veja quantos amigos. Veja seus professores, os funcionários aqui da escola. Pense em sua família. Você já pensou em quanto cada um contribui para sua formação, para sua felicidade? Você costuma ser grato a tudo e a todos?
Quando temos essa consciência de que a vida é um presente, chegamos à conclusão de que precisamos aproveitá-la da melhor forma possível. E aí, temos condições de desfrutarmos com mais intensidade os bons momentos. Encontrarmos disposição e forças para enfrentarmos os maus momentos e as dificuldades. Encontrarmos motivos para valorizar as pessoas e até mesmo as coisas que temos.
Coelét descobriu que não há nada melhor para o homem do que ser feliz e praticar o bem enquanto vive.
Tudo isso faz com que a vida tenha mais sentido."
Reflexão dirigida na aula inaugural, por Eleanor Teruya,
professora de filosofia e teologia.
Londrina, inverno de 2014